quinta-feira, 7 de junho de 2007

“Há muitas armadilhas no mundo e é preciso quebrá-las” – Ferreira Gullar


Temário do 16° COLE - 10 a 13 de julho - Unicamp - CAmpinas

Releitura do Poema de Ferreira Gullar: "No mundo há muitas armadilhas"

Há muitas armadilhas no Brasil contemporâneo e sem dúvida que é preciso cuidadosa, coletiva e solidariamente, identificá-las para desarmá-las e quebrá-las. Extirpá-las... A realidade brasileira que hoje se vê e que hoje se vive, produzida no transcurso da história, tem muito de embustes, de embromações; tela pintada com as cores do ardil e da armação; entrelaçado no qual se misturam, disfarçadamente, arapucas e alçapões.

As armadilhas econômicas: fundos buracos sulcados em todas as regiões brasileiras. Nos sertões. Nos morros. Nas periferias das cidades. Em beiras de rios. Ao lado das estradas. Debaixo de pontes. Ocupações, favelas. E junto, o exército de famintos e miseráveis, existindo precariamente, sem dignidade, à base de reais contados, estipulados, minguados. Ainda se constata, em pontos do país, o trabalho infantil, o trabalho escravo, a exploração selvagem do trabalho. Reina o desemprego!


As armadilhas da política: logros e manobras tapados à peneira, ofuscando responsáveis e responsabilidades. O mote e os botes do mensalão. As sanguessugas chupando benesses da saúde. Sovinice, enriquecimento ilegal, ilícito. Muitos truques, várias ratoeiras. Currais eleitorais. Voto de cabresto. O político coronel mandão enverrugado na paisagem social. Impera a impunidade!

As armadilhas da globalização: lógicas internacionais que não constituem uma lógica universal humanizante, que são vesgas e caolhas, a ditarem comportamentos e estilos padronizados de vida aos brasileiros. Os mercadores, dominadores do passado e do presente: ingleses, franceses, norte-americanos, japoneses, coreanos, espanhóis, noruegueses, finlandeses, etc A subliminar ação arrasadora da tecnologia e da mídia: o apagamento da memória, a destruição galopante da identidade nacional. Erguem-se as falsas portas!


As armadilhas culturais: a erudição e o beletrismo perfunctórios, incrustados nas mentes e nas mentalidades. O imaginário, potente e prepotente, reproduzido no avanço dos séculos. Hoje o luxo e o lixo. A elite e a ralé, o povão. As cortes e os súditos. Os “socialites” e as putas de esquina. Os brancos contra os negros e os índios, eternos subalternos. O preço inatingível da pintura, da escultura, do paisagismo, da entrada do teatro, do cinema, do livro, do show de música. Fronteiras e divisões preconceituosas, perigosas, falsas. Amplifica-se exponencialmente o sensacionalista e o grotesco!


As armadilhas educacionais: escolas enlaçadas na mediocridade e os sonhos que sempre redundam em pizza. Morrem na praia. A luta dos educadores: água mole em pedra dura, tanto bate e nunca fura. O comércio das particulares: burro carregado de livro é doutor. O estado das escolas públicas brasileiras: casa de ferreiro, espeto de pau sem carne salarial, sem brasa infra-estrutural. O esquecimento calculado da educação pública e universal: por fora bela viola por dentro pão bolorento. Zangam-se as comadres, descobrem-se as verdades. Entristecem-se os professores!


E todas essas armadilhas se concretizam às escondidas, enjauladas em palavras, em símbolos, em discursos. Como pode o leitor desenjaulá-las, desvelá-las, desocultá-las ou, como diz o poeta, “quebrá-las”? Talvez, um ser-leitor historicamente situado lutando com, nos e pelos discursos que circulam nessa sociedade injusta e de privilégios. Talvez, uma experiência de leitura, como placenta geradora de reflexões e ações críticas sobre o mundo, como chave para a destravagem das ratoeiras da informação, das ciladas dos imorais, das velhacarias dos emporcalhados, dos conluios dos conservadores e das armações do poder.

Nas iniciativas e nos movimentos, nos gestos e desejos, o leitor, pela leitura, talvez, possa entremear-se nas armadilhas discursivas perigosas e traiçoeiras, produzir sentidos outros das coisas, dos fatos, dos fenômenos, desarmá-las. Verso e reverso? Contradições talvez melhor mostradas na penúltima estrofe do mesmo poema de Ferreira Gullar:


“O certo é que nesta jaula há os que têm e os que não têm;

há os que têm tanto que sozinhos poderiam alimentar a cidade

e os que não tem nem para o almoço de hoje”.


Ezequiel Theodoro da Silva

Campinas, novembro de 2006


Um comentário:

EQUIPE DE COORDENADORAS MUNICIPAIS DE ANDRADINA disse...

Aramadilhas as temos em qualquer lugar que vamos ou estamos. Os que pecam são os desavisados na sua grande maioria. Cabe aí ter bom senso, pois; "água mole em pedra dura tanto bate até que se pode desviar dela".